quinta-feira, 9 de janeiro de 2014

Cinderela às Avessas - Capítulo 5: E seu mundo vira de ponta-cabeça


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E seu mundo vira de ponta-cabeça

Que sono bom... ela dormia profundamente como se não tivesse que preocupar com mais nada. Pena ter que acordar e enfrentar sua vida injusta de sempre, mas não tinha outro jeito. Não dava para ficar na cama para sempre.

Carmem abriu um olho, depois outro, esfregou o rosto por um tempo e foi até o banheiro para tomar um bom banho e vestir roupas limpas. Ela caminhou pelo quarto se espreguiçando e quando ia entrar no banheiro, se deu conta de que alguma coisa ali estava muito errada.

- Peraí! Que lugar é esse? – Aquele não era seu quarto. Quer dizer, ela ainda estava na sua mansão, mas em outro quarto diferente!

Apesar de ter o mesmo tamanho, não tinha a decoração feita especialmente para a filha mimada do casal mais rico da cidade. Era tudo bem simples e estava arrumado como se aquele quarto não fosse usado há muito tempo. Que estranho, será que ela tinha ido parar num dos quartos de hospedes sem perceber?

- Será que eu sou sonâmbula? Credo, só faltava mais essa!

Quando saiu para o corredor, sua cabeça ficou confusa. Pela posição da porta, ela estava sim no seu quarto. Mais para o lado, estava o quarto dos seus pais. Então o que estava acontecendo?

- Essa não! Será que eles tiraram minhas coisas enquanto eu dormia? Ah, só pode ser isso! Aqueles desalmados querem tornar minha vida pior do que já está! Isso não vai ficar assim não!

Para seu desapontamento, eram dez da manhã. Seus pais já saíram para trabalhar. Tudo bem, ela falaria com eles na hora do almoço. Por enquanto, era preciso colocar alguma coisa comestível em seu estômago.

Como os armários estavam vazios e ela não achava suas roupas em lugar nenhum, Carmem teve que descer para a cozinha com as roupas do dia anterior, coisa que ela odiava.

- Maria, arrume o café pra mim que eu tô com fome! – ela falou de forma grosseira e sentando-se a mesa. 

A mulher virou-se rapidamente e deixou algumas vasilhas cair no chão por causa do susto.

- Como foi que você entrou aqui?
- Entrei pela porta, sua ignorante! Agora prepara logo meu café que eu não tenho tempo pra bobagens!
- Quem é você? Moça, você sabe que é crime entrar na casa dos outros sem permissão, não sabe?
- Ficou doida? Pára com isso, ouviu? Não gosto dos empregados fazendo piadinhas!

Ignorando suas ordens, a mulher deu um grito pedindo socorro.

Outra empregada entrou rapidamente, seguida pelo jardineiro.

- Socorro! Ela entrou aqui e tá se achando a dona da casa!
- Aposto que tá drogada, olha a cara dela! – o jardineiro falou.
- Vamos chamar a polícia!
- Como se atrevem? Vou contar tudo pro meu pai, ouviram? Ele vai mandar vocês pro olho da rua!

As duas mulheres foram para o canto da cozinha e o jardineiro segurou Carmem pelo braço.

- Chama a polícia que eu seguro essa doida!
- Ei, que atrevimento é esse? Me solta agora mesmo!

A polícia chegou rapidamente e dois guardas a levaram dali com dificuldade, pois ela esperneava e até mordia o braço deles.

Ela foi colocada na viatura sob o olhar espantado dos vizinhos e levada dali em prantos. Já cansada de tanto gritar, Carmem afundou no banco do carro pensando na razão de tudo aquilo estar lhe acontecendo. Seria algum castigo dos seus pais? Era óbvio! Primeiro tiraram seu cartão de crédito e as roupas que ela tinha comprado. Depois esvaziaram seu quarto e agora mandaram os empregados tratá-la como se ela fosse uma estranha.

Tudo aquilo só para forçá-la a fazer o que eles queriam, não tinha como ser outra coisa e Carmem esperava que dentro de uma hora ou duas seus pais iam aparecer na delegacia para lhe dar um grande sermão e levá-la de volta para casa.

“Eles estão jogando muito sujo dessa vez, mas vão ver só uma coisa! Comigo ninguém brinca desse jeito!” 

Por ser menor de idade, os guardas a colocaram em uma cela separada até aparecer alguém para encaminhá-la a uma instituição adequada.

- Credo, essa garota grita demais! – o delegado falou sentindo dor nos ouvidos. – Chamem logo o juizado de menores antes que todo mundo aqui fique surdo!

Após gritar por uma hora inteira e quase causar uma rebelião entre os outros presos por causa da sua gritaria, Carmem acabou se cansando e sentou-se na cama da cela sentindo a cabeça dando várias voltas. Por que seus pais estavam demorando? Será que pretendiam deixá-la naquele ninho de pulgas o dia inteiro? Presa como uma criminosa? Ela, a Carmem Frufru?

“Eles estão passando dos limites dessa vez! Isso é crueldade!”

Lá pela uma da tarde, um policial abriu a cela e falou.

- Mocinha, a mulher do juizado de menores veio te buscar.
- Como é? – ela olhou para trás do guarda e viu uma mulher bem vestida. Ela usava um terninho bem alinhado e uma calça preta. Seus cabelos estavam presos em um coque elegante. Aquele rosto era bem familiar. Após um tempo, Carmem acabou a reconhecendo.
- Madame Creuzodete? O que tá fazendo aqui?
- Então você já conhece, né? Deve ser muito encrenqueira mesmo! – o guarda falou antes de deixá-las a sós.
- Venha comigo e sem resmungar. Dei um jeito de tirá-la daqui e eles não farão nenhuma ficha com seu nome.
- Meu pai te mandou por acaso?

Creuzodete saiu da delegacia e Carmem correu atrás fazendo várias perguntas de uma vez.

- O que tá acontecendo aqui? Exijo explicações agora mesmo!

A vidente parou e encarou a moça com o olhar firme.

- Acredita em fazer desejos para estrelas?
- Como é?
- De noite, no seu quarto, olhando pela janela. Uma estrela brilha mais do que as outras, te prendendo hipnoticamente.
- Que papo é esse? – ela perguntou sentindo arrepios desagradáveis.
- Então, sem pensar no que está fazendo, você faz um pedido. Pois bem: seu pedido se realizou!
- Que pedido? Eu não fiz nenhum pedido, ouviu?
- Se não tivesse feito, não estaria aqui. Vamos, tente se lembrar do que pediu.

Foi preciso puxar bem na memória para lembrar da noite anterior, quando ela contemplou aquela estrela pela janela e fez o pedido. Suas próprias palavras ecoaram na sua cabeça, enchendo-a de pavor.

“Eu desejo nunca ter nascido nessa família, nem nesse bairro, nem ter conhecido aquele bando de traidores! Desejo nunca ter conhecido ninguém aqui!”

- Não, isso não pode ter acontecido! Esse troço de fazer pedido pra estrelas não existe, você tá falando isso pra me assustar! Quanto o meu pai te pagou pra fazer essa palhaçada? É tudo coisa dele, não é?

Creuzodete resolveu ir direto ao assunto.

- Entenda uma coisa: você não é mais a filha rica e mimada do casal Frufru, nunca conheceu seus amigos, nem estudou no colégio do limoeiro. Agora você não é ninguém. Não tem casa, família, nem amigos. Não tem nada!
- Mentira! Eu sou muito rica, meus pais tem muito dinheiro!
- Sim, o Sr. e Sra. Frufru são muito ricos, mas as coisas mudaram. Para todos os efeitos, eles nunca tiveram filhos e não vão lhe reconhecer.
- Vão sim! Eles são meus pais, nunca virariam as costas pra mim! Quer saber? Vou pra casa agora mesmo!

Ela saiu dali ignorando os avisos da outra e teve que caminhar muito até chegar a sua mansão. Lar doce lar! E daquela vez, a lição foi aprendida. Se seus pais queriam que ela mudasse, então ela ia mudar para não ter que passar por tudo aquilo novamente. Eles sabiam ser cruéis e jogar pesado. Não dava para lutar contra aquilo.

- Pai, mãe! Abre a porta, me deixa entrar! – ela pediu batendo a campainha várias vezes. A empregada atendeu e gritou ao deparar com aquela garota maluca.
- Socorro! Ela voltou!
- Para com isso, Maria! Deixa eu entrar, vai! Quero falar com meus pais!
- Ninguém aqui te conhece, vai embora! – a mulher falou fechando a porta. Num gesto rápido, Carmem empurrou a porta com força e entrou na sala como um foguete chamando por seus pais. 

Um casal elegantemente vestido apareceu no topo da escada assustado com todo aquele escândalo.

- O que está acontecendo aqui?
- Senhora, essa doida entrou na casa achando que mora aqui!
- Mãe, pai! Que bom ver vocês! – Carmem falou subindo as escadas e os dois recuaram mostrando claro receio.
- Do que está falando? Nós nem te conhecemos!
- Por favor, paizinho! Eu já aprendi a lição, juro! Nunca mais faço aquelas coisas, tá? De hoje em diante, serei uma boa filha, prometo! – ela falou tentando se fazer de doce meiga. A dona da casa ordenou.
- Menina, saia dessa casa agora mesmo ou chamaremos a polícia!
- Mãe...
- Eu não sou sua mãe. Você precisa de ajuda, se quiser podemos encaminhá-la a uma instituição adequada, mas não tente mais invadir essa casa!
- Instituição? Eu não preciso disso, preciso que vocês acabem com esse castigo maluco agora mesmo!

Vendo que não tinha como argumentar com aquela lunática, o casal ordenou.

- Maria, chame a polícia! 
- Polícia? De novo? Não, por favor!
- Então saia daqui nesse instante! – o homem ordenou. – E procure tomar vergonha nessa cara e mudar de vida! Invadir a casa dos outros é crime, ouviu?

A empregada já estava pronta para chamar a polícia. Seus pais não lhe ouviam, pareciam nem mesmo reconhecê-la. O jardineiro e o chofer entraram na sala para prendê-la e Carmem acabou se apavorando. Não, eles não iam prendê-la de novo e nem mandá-la para aquela cela espremida e imunda! De jeito nenhum!

Sem pensar duas vezes, ela saiu dali o mais rápido possível e tomou a rua, correndo sem rumo. Por que seus pais estavam agindo daquela forma tão cruel? Aquilo era loucura! Pelo visto, eles não iam ceder tão cedo.

- Por que eles estão fazendo isso? Por quê? Eu não fiz nada demais pra merecer isso, não é justo!

Como não tinha mais medo de ser pega, ela parou de correr e começou a andar com passos lentos e cansados. De repente, a visão de pessoas familiares fez com que ela se enchesse de esperança. A ajuda estava a caminho!

- Vocês também vão viajar, Ce?
- Só por uma semana. A gente volta antes do natal. 
- O Quim vai fazer muitas gostosuras de natal esse ano. Ai, mal posso esperar! A festa do seu Quinzão vai ser a melhor de todas!
- Como eu passei direto, o velho lá em casa vai me dar um skate novinho! É nóis!

Apesar de muitos tropeços, aquele ano prometia terminar bem e todos estavam felizes, planejando suas férias e torcendo para que ficassem na mesma turma no próximo ano.

No meio da conversa, eles foram surpreendidos por uma garota que apareceu de repente. Ela estava com as roupas desalinhadas, o cabelo desgrenhado e tinha cara de ser maluca.

- Pessoal! Vocês precisam me ajudar! Meus pais ficaram doidos, me colocaram de castigo e agora tô até sem casa pra morar!

Eles se entreolharam por um tempo e Mônica perguntou.

- Peraí... a gente conhece você?

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